Julgamento do Vigia Noturno que dormiu no trabalho

Recentemente, revendo algumas decisões passadas dos Tribunais Regionais do Trabalho deparei-me com uma do TRT de São Paulo que me chamou atenção graças a excepcionalidade de como foi proferida. Era uma ação de julgamento de um vigia noturno que foi demitido por justa causa por estar dormindo durante a sua jornada de trabalho. O Tribunal entendeu que o sono é uma necessidade biológica e ninguém tem controle sobre ele. Até aí penso que todos nós concordamos. Só que essa decisão não foi para proteger o ato de relaxar, dormir, como um estado de repouso que as pessoas utilizam para descansar e recuperar suas energias. Dessa vez foi para absolver um vigia noturno que foi demitido por ter sido apanhado dormindo em pleno horário de trabalho. É bom que se explique como a coisa aconteceu: Um ex-empregado de uma empresa de segurança e vigilância foi dispensado após ter sido flagrado deitado no sofá, com uma almofada sob a cabeça servindo de travesseiro e uma blusa servindo de lençol cobrindo o seu corpo. Ele ficou furioso com a iniciativa da empresa em demiti-lo por justa causa e decidiu se defender em juízo. Surpreendentemente ele ganhou, o que abre um precedente vulnerável colocando em questão a relação entre o trabalho e a determinação compromissada de alcançá-lo como fim. Do ponto de vista do Direito do Trabalho, três elementos são importantes para caracterizar as relações que ele regula: Uma tarefa a executar; uma autoridade que dirige esta execução e uma pessoa que assegura a realização. No momento em que este quadro se quebra, o processo deixou de existir na sua integralidade, e conseqüências podem advir em detrimento da sua realização plena. A pessoalidade da prestação do trabalho, ou seja, a obrigação de fazer aquilo que foi contratado e pago para ser feito pressupõe a sua realização. Existem tarefas que requerem uma medição mais austera em relação a sua natureza. Na de vigia noturno, qualidades como o esforço, responsabilidade e consciência são características fundamentais de comportamento, pois vidas e patrimônios dependem da sua realização. Não há duvidas, após tantas décadas, de que o homem acostumou-se a trabalhar durante o dia e de que necessita de tempo para adaptar-se às condições do trabalho noturno, e exatamente por ser assim, que algumas regras e vantagens foram introduzidas na CLT – Consolidação das Leis do Trabalho como compensação, entretanto, cada vez mais a vida urbana tem exigido a presença de trabalhadores em horários não diurnos. Essa demanda em estado contínuo tem provocado alterações no metabolismo, adaptando-o a essa nova condição. Porém, algumas decisões do judiciário demonstram que o excesso de zelo não condiz com a realidade imposta pelas transformações nas relações do trabalho que o mercado hoje tem. Não é incomum em decisões dessa natureza, a proteção aos fatores fisiológicos e biológicos como forma natural e humana de se julgar, já que contra certos fatores complexos de funções orgânicas não possuímos o domínio integral. Nesses casos privilegia esta condição até mesmo como uma advertência ao empresário supondo o exagero nas suas exigências do trabalho. Sei que existe bastante e eu não observo, entretanto, a preocupação daquele empregado que trabalha sob escala, geralmente 12 x 36, ou seja, trabalha 12 horas e descansa 36 horas, em usar seu tempo livre de repouso remunerado para o descanso. Não é incomum vê-lo envolvido com outra atividade, gastando suas energias. Independentemente de como tenha ocorrido o fato estamos diante de uma decisão preocupada mais com a tutela social respaldada na defesa dos aspectos biológicos da pessoa, sobretudo da sua fragilidade de vencer o cansaço, do que propriamente com a avaliação de conseqüências para quem o contratou. Isto representa um alerta e exige uma reflexão mais severa dos empresários, síndicos e de outras categorias contratantes, pois tais situações importantes, sendo consideradas normais, podem trazer sérios desconfortos na hora de se exigir que as cumpram.
Ubiratan Bonino – Consultor e Parceiro da HR Hunter

 

HR Hunter, Consultoria de Recursos Humanos do Rio de Janeiro, tem como expertise: Recrutamento e Seleção, Treinamento Comportamental, Plano de Cargos e Salários, Pesquisa de Clima e Coaching.